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terça-feira, 15 de março de 2011

AINDA JÂNIO

Jânio da Silva Quadros nasceu nas bandas de Mato Grosso, aí nos 1918. Fixou-se em São Paulo, acatado professor de Português e de História nos colégios secundários. Ganhou a estima da estudantada: cumpria o dever e sabia ensinar. Por influência dos meios estudantis, ingressou na política, com a pretensão de eleger-se vereador. Pobre, conquistou simpatias com a sinceridade das suas falas aos leitores.

Era 1947. Somente em alguns estados havia coincidência de eleições de governadores, senadores, deputados e cargos eletivos municipais. As presidenciais eram de cinco em cinco anos, coincidentes com alguns governadores, como o do Parnaíba, por exemplo, a quem se conferiu um qüinqüênio de mandato.

Em São Paulo eram poucas as coincidências dos diversos pleitos. Jânio, na disputa da vereança, logrou uma segunda ou terceira suplência num partido sério, mas pequeno. O presidente Dutra, porém, declamou guerra aos comunistas e, com a conivência da Justiça e do Congresso, cassou o registro do Partido Comunista e o mandato de quantos comunas estivessem no seu próprio grêmio partidário ou metidos noutras agremiações. Sobraram vagas e deu-se o aproveitamento de Jânio Quadros, para a mais fulminante carreira política feita no Brasil.

Mal chegava ao final do mandato de vereador, Jânio era conduzido à Assembléia Legislativa. Não terminou os quatro anos da legislatura, consagra-se prefeito de São Paulo, derrotando oito partidos fortes e dezenas de políticos célebres e endinheirados. Foi a luta do TOSTÃO CONTRA O MILHÃO. Nascia o FENÔMENO. Antes de findar o seu período administrativo na Prefeitura, mais uma vez vitória retumbante levava-o ao governo do estado, em que passou os quatro anos completos do mandato, embora alguns meses antes do fim já estivesse eleito deputado federal pelo Paraná.

Nas eleições de 1960, mais de seis milhões de brasileiros lhe confiaram a presidência da República. Assumiu a 3 de janeiro de 1961 e a 25 de agosto do mesmo ano renunciou ao poder, na tentativa, segundo penso, de um golpe, para fechar o Congresso e criar o regime ditatorial.

Tentou voltar ao cenário político. Derrotado na candidatura ao governo de São Paulo. Direitos políticos suspensos por dez anos. Em 1985, ganhou a eleição de Prefeito de São Paulo, assumindo a primeiro de janeiro de 1988. Administração modelar. Sofre permanente campanha de descrédito dos poderosos órgãos de comunicação da capital paulista. Leiam, porém, editorial do "Jornal do Brasil", do Rio, edição de 20-4-88, página 10: "Eleito na última safra de prefeitos, o Sr. Jânio Quadros trouxe para o cargo uma convicção que logo pôs em prática: a de que a administração pública não é feita para dar lucro nem prejuízo. A folha de pessoal, para não se tornar uma aberração, deve manter-se em torno de 50% da receita, o que permite a preservação da capacidade de investimentos. São Paulo, até recentemente, parecia entregue a sina dos loteamentos clandestinos: ocupavam-se terras e prédios a torto e a direito, em nome do SOCIAL. O Sr. Jânio Quadros passou a desocupar, em nome do interesse público, o que também é uma forma de agir num contexto SOCIAL. Com isto se tem uma cidade moderna administrada em figurino moderno. O tamanho da proeza, tratando do Brasil e de uma megalópole, granjeou para o prefeito de são Paulo o reconhecimento público. A popularidade bafejou o administrador que, ao populismo barato, opôs as idéias de eficiência e respeito às autoridades".

Jânio, magnífico Jânio.


A. Tito Filho, 27/04/1988, Jornal O Dia

SEU LAMPA

Era madrugada do dia 29 de julho de 1938. Na última quinta-feira o episodio completou cinqüenta anos. Os homens e as mulheres do bando começavam levantar-se, em gostosos espreguiçamentos, bocejantes, quando a fuzilaria teve início. Balas de inúmeras bocas de fuzil matavam os tipos naqueles confins do Estado do Sergipe. Confiou-se a façanha à polícia alagoana, em grupo chefiado pelo capitão Bezerra. No chão de Angico, o esconderijo dos cabras, se contaram onze cadáveres. Alguns da cabroeira conseguiram fugir ao cerco impiedoso e de surpresa. Tratava-se do bando de Virgulino Ferreira da Silva, pernambucano conhecido pela alcunha de Lampião, também dito SEU LAMPA, morto ao lado de Maria Bonita, com quem ele viveu em amancebamento, prodigalizando-se reciprocamente um amor romântico debaixo das árvores às vezes de boa sombra na terra sertaneja. Sexo no cangaço.

Muitos homens entraram na história do Brasil por caminhos diferentes, da mesma forma que noutros países. John Wilkies Booth não se separa do presidente norte-americano Lincoln, uma vez que o primeiro matou o segundo, nem de Chicago desaparece o nome de Al Capone, chefe de GANGSTERS, e a Alemanha e o mundo nunca esquecerão Hitler. Antes de Lampião viveu Antônio Silvino, célebre governador do sertão, cangaceiro ilustre, preso e condenado, e cuja pena mereceu comutação de Getúlio Vargas, na década de 40. Silvino visitou o presidente para agradecimento, deu entrevista a jornais, revistas e a escritores.

Domingos Jorge Velho sentou-se na história do Piauí, mas na verdade o seu extraordinário heroísmo verificou-se no genocídio do quilombo dos Palmares. O presidente da República chamado Prudente José de Morais Barros, enviou exércitos para combate a Antônio Conselheiro, no arraial de Canudos, terra baiana, o primeiro núcleo socialista da América do Sul. Uma campanha injusta, infame até, se promoveu na imprensa nacional contra o barbudo comandante dos caboclos na comunidade de que Euclides da Cunha se serviu para mostrar com segurança a miséria do interior brasileiro. Milhares de soldados da República eram repelidos e morriam às pencas. Conselheiro seria o primeiro chefe de guerra de guerrilha nas Américas, estrategista sem igual. As tropas presidenciais ao menos conseguiam aproximar-se do casario da caboclada. Conselheiro queria apenas que os latifundiários do cacau pagassem decentemente os trabalhadores explorados. Rico tem raiva de pobre.

Lampião foi vítima de um Brasil atrasado, roubado pelo coronelismo impiedoso, cujos filhinhos mimados emprenhavam as cunhazinhas amedrontadas - um país sem lei, sem alma, perverso com os humildes, espoliador dos pobres. Vigorava um aparelhamento policial embrutecido e violento, de assassinos impunes. Nesse clima, haveria de surgir o cangaço, ou o cangaceiro vingativo e cruel. Hoje os estudos de quantos se têm preocupado com o fenômeno do fora-da-lei demonstram que esses homens viviam da violência para que pudessem sobreviver.

De 1925 a 1938, Virgulino atormentou vários Estados. Não andou no Piauí. Matava e pilhava, para vingar as barbaridades policiais contra a sua família. Foi traído por um coiteiro, tipo que prestava serviços aos cangaceiros. A polícia cortou as cabeças dos onze cadáveres no esconderijo de Angico. Arrumou-as num caminhão e com elas percorreu alguns trechos do território nacional, sob aplausos da plebe ignara e dos coronéis interioranos. Em Salvador da Bahia terminou a exibição macabra. As cabeças se incorporaram a um museu e muitos anos depois encontraram o descanso do sepulcro.


A. Tito Filho, 31/07/1988, Jornal O Dia

OS SÓCIOS

Em artiguete anterior, vimos que o trabalho objetivo de Cláudio Pacheco e outros jornalistas criaram a primeira entidade jornalística do Piauí, a Associação Piauiense de Imprensa, noite de 31 de janeiro de 1933. Elegeu-se a diretoria provisória que divulgamos. Ainda por sugestão de Cláudio verificou-se o primeiro Congresso de Imprensa do Piauí, cuja sessão preparatória teve lugar a 22 de julho na sede da Associação Comercial Piauiense. Publicamos nesta coluna os nomes dos jornais e jornalistas presentes. No dia seguinte, instalação solene do Cinema Olímpia, praça Rio Branco. Houve sessões ordinárias em número de cinco, inclusive a de encerramento, entre 24 e 28 de julho, inscreveram-se quatro teses:

1) Criação e desenvolvimento da imprensa no Piauí (feição moral, compreendendo o histórico das campanhas jornalísticas ocorridas no Estado), de Higino Cunha.

2) Criação e desenvolvimento da imprensa no Piauí (feição material, compreendendo o aparecimento do primeiro jornal e o histórico do desenvolvimento das artes tipográficas no Estado), de Joel Oliveira.

3) Liberdade de imprensa (compreendendo censura e ética jornalística), de Cláudio Pacheco.

A quarta tese - o jornalista (estudo de sua figura em relação ao meio), de Pedro Conde, a pedido do autor foi suprimida do programa estabelecido.

O Congresso aprovou os Estatutos da Associação Piauiense de Imprensa e elegeu a primeira diretoria da entidade: presidente, Cláudio Pacheco; vice-presidente, Heráclito Sousa; 1º secretário, Antônio Neves; 2º secretário, Álvaro Ferreira; e tesoureiro, Joel Oliveira.

Conselho Fiscal: Benedito Pestana, Luiz Mendes Ribeiro Gonçalves e B. Lemos.

Comissão de Sindicância: Heráclito Sousa, Leopoldo Cunha e José Messias Cavalcanti.

Departamento de Publicidade: Antônio Neves, Benedito Pestana e Osíres Melo.

Posse a 6 de agosto de 1933, com mandato até 31 de maio de 1934.

Eis a relação geral dos primeiros sócios da Associação Piauiense de Imprensa:

Teresina: Cláudio Pacheco, Heráclito Sousa, Antônio Neves, B. Lemos, Álvaro Ferreira, Frederico Schmidt, Leopoldo Cunha, Martins Napoleão, Baurélio Mangabeira, Luiz Mendes Ribeiro Gonçalves, Cronwell de Carvalho, Luiz Lopez Sobrinho, Antonino Freire, Vaz da Costa, Higino Cunha, Esmaragdo de Freitas, Joel Oliveira, José Severiano da Costa Andrade, João de Oliveira e Sousa, Joel de Andrade Sérvio, Celso Albuquerque, Adolfo Alencar, padre Helvídio Mata, Raimundo de Brito Melo, Elias Martins, José Fonseca Ferreira, Cristino Castelo Branco, Pedro Borges, Antônio Costa, Pedro Brito, Almerinda Vieira Nunes, Benedito Pestana, Heitor Castelo Branco, Antônio Chaves, Osíris Melo, João Pinheiro, Leão Marinho, Mário Batista, Martins Vieira, Epifânio de Carvalho, Nelson Cruz, Vitor Martins, Domingos Monteiro, José de Arimathéa Tito, padre Israel Souza, Augusto Ewerton e Silva, José Messias Cavalcanti, Odilon Nunes, Mário Bento, Oliveira e Ferres, Moura Rêgo e Helvécio Coelho Rodrigues.

Parnaíba: Epaminondas Castelo Branco, Elias Magalhães, Alarico da Cunha, padre Roberto Lopes, Édison Cunha, Daniel Paz, Adolfo Santos, Humberto Fonseca, João Pinto, Raul Primo e Lima Rebelo.

Floriano: Alceu Brandão, Veras de Holanda, Hosternes Brandão, José Pires Ferreira e Osvaldo da Costa e Silva.

Amarante: Pedro Conde e Cunha e Silva.

Picos: Joaquim Leitão.

Campo Maior: Mário da Costa Araújo.

Simplício Mendes: Isaías Coelho.

José de Freitas: Antônio Freitas.

Altos: Gonçalo Cavalcanti.


A. Tito Filho, 29/04/1988, Jornal O Dia

segunda-feira, 14 de março de 2011

MENTIROSOS

As estórias fiadas dos grandes mentirosos estão incorporadas ao folclore das coletividades. Ouvi muitas dessas narrativas no interior e li-as depois em livros de estudiosos dessas interessantes e curiosas manifestações populares.

Em Teresina meu querido e inesquecível Mário José Baptista contou o episodio de um macaco que ele ensinou a pular com extraordinária perícia. Se o bicho saltava de um galho para outro e no meio se arrependia, o referido esperto animal fazia finca-pé no ar e facilmente retornava ao local de origem.

É comprida a coleção das lorotas humanas. Homens e mulheres têm imaginação fértil, sobretudo estas quando ajudam os maridos nas cabeludas mentiras.

Tornou-se vulgaríssima em Minas a conversa de Joaquim Bentinho com os dois amigos que o visitavam e aos quais ele contou que um dia, quase boquinha da noite, sentado à porta da casinha tosca daqueles perdidos do interior mineiro, viu no descampado, ao longe, um vultozinho. Coçou os olhos, reparou direito era um veado. Agarrou a espingarda, carregada só com um cartucho. Fez pontaria segura, e houve o papouco. O bicho deu salto, bateu no chão e imobilizou-se. Bentinho buscou a caça, estava morta, rasgo de bala no casco e na orelha. Os ouvintes admiraram-se: uma bala só, dois buracos? A mulher por perto não deixou que o marido mentisse:

- Tu não se alembra que o animá tava coçando a orêia?

Gustavo Barroso encontrou essa rabuda mentira entre os campônios de França e do folclore de outras gentes anotou invencionice que os nossos matutos também contam.

Lembrou-me do bom Capivara, caboclo que tomava conta de um sítio de meu pai nos arredores de Barras, neste Piauí famoso. Bebedor permanente de cachaça, calmo, tranqüilo, Capivara nunca deixou de deliciar as pessoas, na choupana modesta onde morava como caseiro, encarregado do cajual, das mangueiras e outros pés de frutas, com mentiras bem contadas.

Ouvi uma delas, certa vez, e a encontrei como estória matuta do sertão brasileiro em Gustavo Barroso.

Capivara contava-a como cousa acontecida, verdadeira, segundo dizia, como Deus no céu. Ele gostava de criar papagaios. Conseguiu onze dessas aves faladoras. Nas novenas ouvia o padre rezar a ladainha com as beatas na ajuda, vozes fanhosas. Achou que os papagaios deveriam aprender esse hino religioso e tratou logo de efetuar a ensinança. O mais velho dos papagaios cantava o verso do cântico bonito em louvor da Virgem Maria, e os dez papagaios mais novos respondiam o ORA PRO NOBIS. Uma maravilha.

Há mentirosos de todo tipo.


A. Tito Filho, 31/12/1988, Jornal O Dia - p. 4

MEMÓRIA

Recebi do culto conterrâneo Anízio Cavalcanti o seguinte sobre o saudoso Alarico José da Cunha:

"A década dos anos 20 (1921-1930) foi a época em que o cronista saía da adolescência e se expendia no meio exterior à família. Foi o tempo em que entrou no âmbito ainda crepuscular dos primeiros contactos com os mais velhos. O sair do adolescente para um relacionamento mais dilatado fez que ele, com a memória fresca, retivesse, pela vida inteira, fatos, coisas e reminiscências que se abeirassem de sua vida familiar. E, dentro dessa perspectiva do seu viver, já matizado das primeiras aproximações com os demais seres humanos - ele fixou inconscientemente alguns deles, cuja efígie, nos gestos e atitudes, lhe ficou na memória como um retrato subjetivo.

Anos de 1926 a 1928... Fim das tardes calmas, ensolaradas. Pessoas já voltam do trabalho. Parnaíba, a terra de céus claros e vento brando que vem lá do mar... Dois intelectuais piauienses caminham pelo espaço amplo da Praça da Graça, caminho freqüente de quem vai para o trabalho. Encontram-se mais uma vez. Saúdam-se, no abraço fraterno do costume da terra. E, depois das primeiras palavras, um assunto vem à tona o destino da alma humana, o karma, cerne das crenças das vidas. Um, é Gonçalo Cavalcanti, o outro é Alarico Cunha. Naquela época, os círculos intelectuais de Parnaíba voltavam-se para obras de feição espiritualista, sobre religião, hinduismo, budismo, esoterismo.

Nos meus ouvidos de adolescente, ressoavam os nomes de Helena Blavatski, Jinarajadasa, Vivekananda, Annie Besant, Leadbeater, Olcott e outros vários, ingleses, estudiosos de religião da Índia. Na conversação, eu de quando em quando ouvia referencias aos vedas, ao Bhagavad - Gitá e aos Upinashiads... Meu pai Gonçalo e Alarico pareciam por vezes desprender-se do solo da praça e viajar até as longinquas montanhas dos Himalaias (o nome é plural) em busca dos caminhos - dos iogas - que levam o homem ao bem-estar (Hatha-Ioga), ao conhecimento (Gnani-Ioga), à mente iluminada (Raja) e ao cume supremo da ascensão mística, a Bhakti-Ioga. A noite vinha surpreendê-los na conversa embevecida. E era nessas ocasiões que meus olhos se fixaram em Alarico, homem estudioso, bondoso, cultíssimo, de elevada espiritualidade. Por influência da lembrança de seu vulto, minha pequena estante de livros abriga dois volumes de Yogi Ramacharaka, divulgador hindú da filosofia religiosa dos VEDAS e da VEDANTA. Vez por outra, para rever conceitos da filosofia oriental, meu braço se alonga e minha mão apanha o 'Curso Adiantando de Filosofia Yogi', desse autor; e, ao compulsar o livro, minha memória atravessa o tempo passado e eu vejo diante de mim dois piauienses intelectuais a conversar sobre um tema que lhes era tão grato: Gonçalo Cavalcanti, pai deste cronista, e Alarico José da Cunha, figura rara do homem culto.

Em verdade a conversação cultural daqueles dois intelectuais se vincula à sabedoria do Cristo, que, naqueles recuados tempos, às margens de Yám Kirenet, mar de Galiléia, encerrava o Sermão da Mantanha e recomendava: 'Buscai primeiro o reino de Deus e sua justiça, e todas estas coisas vos serão dadas por acréscimo' (MATEUS, 6,33).”

ANÍSIO DE A. CAVALCANTI, Niterói.


A. Tito Filho, 28/05/1988, Jornal O Dia

NOVA CONSTITUIÇÃO

Durante mais de um ano e meio esteve reunida mais uma assembléia constituinte. Deputados e senadores debateram assuntos diversos e aprovou-se novos princípios constitucionais, ao cabo de cartas promulgadas a 5 de outubro. Novo pacto passaria a reger o Estado brasileiro, depois da vigência de seis, a exemplo do que se outorgou no Império (1824), o primeiro republicano (1891), o pós-golpe militar de 1930 (1934), o decretado por Getúlio Vargas na manhã de 10 de novembro de 1937, outro em 1964, o de Humberto Castelo Branco em 1967, fora as emendas constitucionais de 1926 e 1969. Cada uma dessas leis magnas acenava com novos processos de vida para as populações do campo e da cidade, sem que até hoje se conhecessem mudanças, salvo as que afligem a imensa maioria das classes populares cada vez mais empobrecidas, enganadas e abandonadas, sem terra e famintas. Bem salientou o finado Getúlio Vargas, que voto não enche barriga. E sempre que surge nova constituição, os seus títulos, artigos, parágrafos e alíneas mais acenam com novas fórmulas salvadoras. Decreta-se a liberdade em todos os sentidos, o amparo dos direitos individuais e sociais, a proteção da família, da cultura, e a família desagrega-se e poucos, raros, conhecem e interpretam os aspectos culturais do Brasil. Ninguém pode viver com os salários de fome da classe média e do operariado - os salários decretados pelo próprio governo. Não é possível crer em constituição, enquanto reduzido número de banqueiros e magnatas exploram o trabalho dos humildes e dos pequenos, sugados até a alma pela ambição do dinheiro e do poder. Constituição institui direitos e deveres, pelo menos dela se esperam normas de garantia da liberdade de não passar fome, de ter acesso à instrução e à educação, de morar dignamente e jamais em habitações desumanas distribuídas pela falsa benemerência oficial. As megalópoles exibem no dia-a-dia da vida milhares de párias nas filas da inexistente resistência social. E a saúde moral e espiritual dos jovens de hoje? A mocidade está rica de maus exemplos, em protestos freqüentes contra a alta sociedade doente que a criou a seu modo e fisionomia. A violência espalha-se por todos os cantos, nascida quase sempre dos desníveis sociais e da afronta da riqueza mal adquirida. Há frustrações econômicas e sexuais nos espancamentos e nos assassinatos. Bem escreveu Paulo César Coutinho, em lúcido exame, sobre a confraternização alcoólica nos botecos e sobre o homossexualismo reprimido, e conclui que a violência se tornou a única conquista democrática neste país. Já os jovens não se miram nos exemplos dos mais velhos, decepcionados com os planos cruzados e os políticos maus. Há o culto das noitadas irresponsáveis. O ato sexual - disse o jornalista - está desacompanhado do amor. Liquidou-se quase a mocidade e desaparecem os valores autênticos. Chegou a hora de dar novos caminhos à juventude, que reclama e merece afeto e amor. Ou se mudam comportamentos ou a deterioração será total. Faliu a sociedade. Que se esperaria da nova constituição republicana? Justiça Social, antes de tudo, a fim de que haja uma equilibrada distribuição de rendas e que poucos não adotem o deboche como norma de educação coletiva. Ninguém esqueça os milhões de brasileiros que apenas assinam o nome, sem capacidade da leitura e interpretação do emaranhado de diretrizes que não vigoram. De 1824 a 1988 nunca se cumpriu uma Constituição do Brasil.


A. Tito Filho, 27/11/1988, Jornal O Dia

NAPOLEÃO

Nasceu em União (PI) a 17-3-1903, na Casa Grande do "Sítio", pertencente a seu bisavô Antônio Martins Viana, sede do patriarca rural em decadência. De família pobre.  Aos dez anos seguiu para Belém (PA), onde cursou o antigo Ginásio Pais de Carvalho e iniciou vida literária, colaborando em jornais e revistas. Auxiliar de telegrafista em Salvador (BA). De 1919 a 1924 residiu no Rio de Janeiro. Passou dificuldades. Operário no antigo Museu Nacional da Quinta da Boavista. Trabalhou no Serviço de Seleção de Sementes do Ministério da Agricultura. Regressando ao Piauí, exerceu os seguintes cargos: Oficial de Gabinete e Secretário do Governador do Estado, Redator do jornal "O Piauí", catedrático do antigo Liceu Piauiense (hoje Colégio Zacarias de Góis), lecionando gramática histórica e filosofia; professor do ginásio São Francisco de Sales, Colégio Coração de Jesus, Escola Normal (línguas); Diretor do Liceu Piauiense, Diretor Geral da Instrução Pública, correspondente a Secretário de Educação e Cultura (duas vezes); Professor de Direito Constitucional da antiga Faculdade de Direito do Piauí; Consultor Jurídico do Departamento das Municipalidades; Secretário Geral do Estado e Interventor Federal. Elaborou a reforma orgânica do ensino estadual em moldes de alto nível pedagógico. Pioneiro da instituição de plano de escolas de iniciação agrícola. Membro do Conselho Diretor da Associação Brasileira de Educação, do Pen Clube, da Academia de Ciências Políticas da Universidade de Colúmbia e da Associação Piauiense de Imprensa. Voltou ao Rio em 1946, como advogado. Integrou o Serviço Jurídico da antiga Superintendência da Moeda e do Crédito. Pertenceu à Consultoria Jurídica do Banco do Brasil, como Chefe-Adjunto do Departamento Jurídico da Carteira de Crédito Agrícola e Industrial. Consultor Jurídico do Banco do Brasil. Labor intelectual extraordinário: professor, ensaísta, conferencista, jornalista, tradutor, advogado, prosador e dos maiores poetas da literatura nacional.

OBRA:

- "Do Latim Castrense ao Romance"

- "Influência Dantesca na Obra de Camões"

- "O Sentimento Brasileiro na Poesia de Bilac"

- "A Criança Problema Básico"

- "O Nordeste e as Grandes diretrizes da Educação Popular"

- "Caderno de Ação Católica"

- "O Piauí e o Nordeste"

- "Aceite Condicional da Duplicata"

- "Dívida dos Pecuaristas"

- "Copa de Ébano" (poesia)

- "Poemas da Terra Selvagem"

- "Caminhos da Vida e da Morte" (poesia)

- "Poemas Humanos e Divinos"

- "O Prisioneiro do Mundo" (poesia)

- "Opus 7" (poesia)

- "O Oleiro Cego" (poesia)

- "Três Cantos do Paraíso"

- "Pequena Antologia de Poemas Alheios"

- "Tema, Coral e Fuga" (poesia)

- "Três Cantos do Purgatório" e

- "Epopéia Camoniana" (conferência).

Martins Napoleão participou do movimento de renovação da poesia brasileira. Alguns dos seus poemas foram vertidos para o espanhol por Gastón Figuera (Uruguai) e Juan Felipe Toruno (El Salvador). É glória das letras piauienses.

Toda a sua obra poética foi reunida por ele em dois volumes, intitulados "Cancioneiro Geral". A prosa literária está num só volume, "Folhas Soltas ao Vento".

Benedito Martins Napoleão do Rego faleceu no Rio de Janeiro, a 30-4-1981, e sepultou-se em Teresina, no dia seguinte.


A. Tito Filho, 28/07/1988, Jornal O Dia

quinta-feira, 10 de março de 2011

FERNANDO

Nasceu na cidade de União (PI) a 26-8-1896. Pais: Augusto Everton e Silva (magistrado) e Eva Gaspar Tobler e Silva, filha de João Gaspar Tobler, de nacionalidade suíça, residente em Amarante (PI).

Estudos primários com o pai, em Colônia, hoje Floriano (PI), que alí mantinha uma escola noturna - a escola São Vicente de Paula. Depois, aluno do Colégio Diocesano e do Liceu Piauiense, em Teresina. Em 1920, prestou concurso para telegrafista. Classificado em 2º lugar e nomeado, passou a exercer as funções em Fortaleza e aí se matriculou na Faculdade de Direito, formando-se a 11-8-1927 - Turma do Centenário da Fundação dos Cursos Jurídicos no Brasil (11-8-1827). Já casado com Maria do Carmo Ribeiro e Silva, de ilustre e tradicional família cearense, deixou a carreira telegráfica, passando ao exercício da promotoria pública de Cascavel, depois de Russas, ambas do Ceará. Em 1929, juiz municipal na comarca de Massapê (CE). Juiz de Limoeiro (hoje Limoeiro do Norte), onde fundou colégio com aulas matutinas (para o sexo feminino), vespertinas (rapazes) e noturnas (comerciantes e lavradores).

Ano de 1931, atendendo a apelo do pai desembargador Augusto Everton e Silva, voltou ao Piauí. Nomeado juiz de direito de Jaicós, aí fundou o colégio Padre Marcos. Foi juiz também nas seguintes comarcas piauienses: Piripiri, Uruçuí, Castelo (hoje Castelo do Piauí), Jaicós (segunda vez) e Floriano - e nesta última exerceu o magistério no Colégio Santa Teresinha. Princípio de 1954, aceitou o juizado da 1ª vara cível de Teresina. Em 1956, subia ao mais alto posto da magistratura estadual, como desembargador do Tribunal de Justiça do Piauí, cargo em que se aposentou, em 1966, ao atingir a idade-limite de 70 anos.

Na capital do Piauí foi acatado mestre, nos seguintes educandários: Ginásio Leão XIII, Colégio Sagrado Coração de Jesus, Escola Normal, Colégio Estadual do Piauí, Ginásio Demóstenes Avelino e, de 1959 a 1966, da Faculdade de Direito do Piauí, como catedrático de Introdução a Ciência do Direito.

Atividades jornalísticas: fundador e redator-chefe do "O Município", na cidade de Cascavel (CE), ano de 1928. Em Fortaleza, ainda acadêmico, colaborou na Revista da Faculdade de Direito do Ceará e nos jornais "Gazeta de Notícias" e "O Nordeste"; em Floriano, quando juiz, no órgão "Cidade de Floriano"; em Teresina, em "Jornal do Piauí". Durante 13 anos presta colaboração ao "Estado do Piauí", da capital piauiense.

Logo depois de aposentado, transferiu residência para Fortaleza - e na capital cearense, entre 1968 e 1971, com artigos de crítica literária, colaborou nos jornais "O Povo", "Unitário" e "Correio do Ceará".

As revistas da Academia Piauiense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí agasalham brilhantes produções de Fernando Lopes Sobrinho.

Obras publicadas: "Padre Marcos, um Missionário do Bem" e "O Direito e a Equidade" (Tese).

Jurista, jornalista, poeta, ingressou na Academia Piauiense de Letras em 1967; deu ao jornalismo uma fórmula nova, jovial de criticar e de julgar, e mostrou que o jornalismo é, antes de tudo, arte essencial, que reclama dons divinatórios do espírito. No seu jornalismo, há um permanente clima de humor - o humor dos ingleses - assim à moda de um Conteline. É que o sal do humor tem um substrato fisiológico, o sal das lágrimas, como acentuou Afrânio Peixoto.

Ao jornalismo uniu a atividade do professor. E educou os moços com fulgurante e acreditada cultura, baseando o ensinamento, sobretudo na compreensão da alma dos jovens, sempre sequiosos de ternura, de alegria, de liberdade. Sentiu que o amor é a base da educação - e destruiu todos os diques que separam mestres e discípulos.

Praticou a justiça que nasceu da cultura e da meditação, talvez do estudo e do sofrimento. A justiça de que todos os direitos vivem em função da sociedade.

Publicou "Enquanto as Trevas não chegam", [de] crônicas e crítica.

Chamou-se Fernando Lopes e Silva Sobrinho. Faleceu em Fortaleza, 1981.


A. Tito Filho, 30/06/1988, Jornal O Dia

GAIOLAS

Este jornal está circulando neste dia 27 de maio de 1988 e até ontem não havia sobrado tempo para uma visita minha à nova coqueluche teresinense, o vapor construído em Parnaíba, batizado Comandante Fausto Silva, agora na capital piauiense, na distância de cento e vinte e nove anos do primeiro GAIOLA, o vapor URUÇUÍ, que se fabricou no Rio de Janeiro.

Esses vaporzinhos antigos eram de excelente viajar. Num deles, em 1942, embarquei em Juazeiro da Bahia, para subir o São Francisco até Pirapora, em minas, e daí alcançar o Rio de Janeiro, por terra. Viagem gostosa. Rapazola, deliciei-me com muita cabloca de beira d'água, nas cidadezinhas da época. Estive na gruta de Bom Jesus da Lapa, espaçosa e clara, na terra baiana. Muita pobreza. Mendigos às pencas, feridentos, doentes, maltrapilhos.

Gostei da cidade de Barra do Rio Grande, margem esquerda da grande corrente fluvial, onde foi aldeia de índios e fez parte do célebre Sertão de Rodelas - que pertenceu à Bahia, passou a Pernambuco, a Minas e voltou ao domínio baiano.

Estive doze dias subindo o rio. Manhãs e tarde monótonas. Noites agradabilíssimas. Dormida ao ar livre, na rede do cheiro da gente. Refeições de bom peixe. O comandante apreciava a boa pinga.

Fiz outra viagem nos GAIOLAS, saindo do Rio de Janeiro em 26-12-1946. Percorremos o São Francisco de Pirapora e a Remanso e entramos no Piauí de caminhão, por São Raimundo Nonato. Alegres companheiros no percurso: Tibério Nunes, Fenelon Silva, Mariano Mendes, Álvaro Ferreira Filho. Atingimos Floriano no dia 18 de janeiro de 1947. Nessa antiga Colônia de são Pedro de Alcântara tomamos passagem noutro GAIOLA, rumo de Teresina. Embarque pelas 11 da manhã e chegada ao ponto final às 7 da manhã de 19, um domingo, quando o eleitorado já buscava os locais competentes para eleger o primeiro governador do Piauí depois das trevas da ditadura de Getúlio Vargas, o médico José da Rocha Furtado, artista do bisturi.

Os naviozinhos que o povo chamava VAPOR desapareceram da paisagem do Rio Parnaíba, faz uns trintas anos. Os do rio São Francisco estão transformados em PALÁCIOS de turismo, com orquestras, AMERICAN BAR, mulheres de aluguel, para milionários em férias, PLEIBÓIS de pais latifundiários, artistas de roquenrol e outras maluquices. Contam que nestes passeios, subindo e descendo o rio, gasta-se muito dinheiro mas goza-se um bocado a vida.

Jorge Amado, num dos seus melhores livros, narra viagem nesses barcos ao tempo do transporte a serviço das populações ribeirinhas. Comovente drama de dezenas de pobres e humildes na segunda classe, amontoados, em severa promiscuidade, e as delícias da primeira classe, no segundo andar do vaporzinho. Uma reportagem forte, vida real, da forma que contou o romancista baiano.

Ainda não sei se o Piauí voltará ao transporte pelo seu Rio Parnaíba, quase sem condições de navegabilidade. Será possível?


A. Tito Filho, 27/05/1988, Jornal O Dia

quarta-feira, 9 de março de 2011

SOCIEDADE DOENTE

Por toda parte, li o anúncio do SHOW MISSE GAY DO PIAUÍ, no Hotel Rio Poty, dedicado à sociedade. Veadagem de luxo esteve presente. O soçaite ganhou uma das suas grandes noites de futilidade, aplaudindo o espetáculo de despudoramento. Do Rio de Janeiro veio, sob contrato, em veadão famoso, milionário muitas vezes à custa desse exibicionismo de perversões sexuais. Pobre Teresina, pobre família teresinense, pobre memória de nossos mortos sagrados, como Dom Severino Vieira de Melo, e tantas mulheres e homens decentes, afrontados na sua compostura por festas assim, em que jovens demonstravam anormalidade do sexo debaixo de palmas e aplausos, seios de silicone, calcinhas, brincos, lábios embatonados e nádegas obtidas com hormônios femininos. A platéia, frenética, deu vivas ao espetáculo. Que espetáculo!

Mestre Raimundo Portella sempre quis dotar Teresina de um hotel confortável e sobre modo decente. Saudoso amigo, homem de bem, deve ter, corado de vergonha ao ver o sultado dos seus sonhos como palco de demonstração de sexo invertido. Dessa forma o soçaite educa a infância, a adolescência e a juventude? Para ser vitorioso na vida, ter dinheiro e fama, conseguir incentivo e aplausos, há necessidade de o ser humano masculino exibir deformações sexuais verdadeiras ou falsas? Quanto se gastou nessa festa em que se divertiu a alta-roda, esbanjando-se dinheiro, para o espetáculo deprimente? Infelizes os que urram e se entusiasma com as perversões sexuais certas ou imitadas. Os veados são doentes, merecedores de tratamento e compreensão, nunca objetos de espetáculos públicos, e os imitadores por dinheiro merecem compaixão. Teresina reproduz agora os bacanais de Sodoma e Gamorra. Ainda virá o terrível castigo aos pecadores.

Crianças, adolescentes e jovens do sexo masculino devem aprender o que o soçaite lhes ensina: a vitória na vida depende das perversões sexuais falsas ou verdadeiras, homenageadas com festas, músicas, aplausos, num momento em que quase todo o povo brasileiro passa fome. A Rússia dos czares era assim, a começar da depravada imperatriz. Havana semelhava um lupanar ao ar livre. Comunizaram-se.

Crianças, adolescentes e jovens abandonem os livros. Devem repudiar as lições dos mestres. Ponham brincos, calcinhas, rebolem as nádegas e ganhem dinheiro à custa do exibicionismo.


A. Tito Filho, 26/10/1988, Jornal O Dia

terça-feira, 8 de março de 2011

PRIVILÉGIOS

Sinceramente, a mulher gozava de muitas regalias e perdeu-as com a história do feminismo. É verdade que não tinha a liberdade de andar batendo coxas pelas ruas. As casadas saíam com os maridos, as outras podiam ir à escola, à missa. Em compensação, de vez em quando havia matinê de danças e bailezinhos bons de namorar de noite. Quando o namoro estava pegado, podiam ir com o futuro noivo ao cinema. Hoje pode a mulher fazer tudo o que pensa, salvo se não tem dinheiro. Anda como quer e com quem quer, de dia e de madrugada.

Mulher de classe média ou de alta-roda não trabalhava em casa. Estava sempre servida de cozinheira, copeira, lavadeira. Mulher de operário, sim, realizava as tarefas caseiras.

A mulher, de modo geral, gozava de cobiçados privilégios. Todas as mazelas da vida se verificavam com os machacás: desde a cobrança de contas do quitandeiro aos desaforos de marido alheio por causa das picuinhas das esposas vizinhas.

Mulher nunca tinha nome: solteiras ou casadas, eram conhecidas pelo nome do legitimo esposo. Quando amancebada, pela denominação do amante respectivo. Era até bonito ser rapariga de cabo da polícia, chofer de caminhão ou gigolô.

Recebiam as filhas-de-eva tratamento excepcional e de fina educação por toda parte. Nas estradas lamacentas, se o caminhão atolava, os adões logo estavam convocados para o empurramento. Elas, nunca, que em tempo algum botaram força, só no ato da parição, antigamente. Nos ônibus lotados, fêmea não ficava de pé. Aparecia o tipo fino, elegante, se levantava e oferecia-lhe o lugar por ele ocupado. Mas agora ninguém lhe cede o assento, até as buchudas ficam se rebolando dentro dos coletivos. De primeiro, se o lenço do rabo-de-saia caia na calçada, o homem corria, apanhava-o e devolvia-o, às vezes sujo de catarro. O individuo namorado, noivo, casado, se via à frente buraco na rua, protegia a companheira, segurando-a pelo braço e advertindo-o do perigo. Agora o pessoal empurra a dona para o precipício. Também os gajos abriam o guarda-chuva, ficavam debaixo d'água, mas cobriam a mulher ao lado, com todo o respeito e aptidão. Hoje elas que se danem.

Quantos privilégios. Regalias sem conta. As mulheres deviam lutar por um retorno aos tempos antigos, às suas origens caseiras. E estou achando que as inteligentes cronistas sociais de Teresina, mulheres antes de tudo, iniciaram, veladamente, a marcha para a volta à submissão do sexo frágil ao homem, a ressurreição do machismo. Pois não é que as nossas cronistas escrevem todo dia o nome do pessoal festeiro, citando o sujeito, seguido de SUA fulana, como se esta fosse dele propriedade? Observem os registros. Compareceram na recepção: o Dr. Pancrário e sua Bigorna, o Dr. Creolino e sua Lascívia, o Dr. Matapasto e sua Estrepolia.

Um bom começo. A mulher nas nossas registradoras de notícias elegantes têm dono. E isto é bom, porque nós sempre as possuímos ao longo da vida, no bom sentido.


A. Tito Filho, 29/03/1988, Jornal O Dia

sexta-feira, 4 de março de 2011

CONSTITUIÇÕES - II

A escolha dos constituintes piauienses para a elaboração, depois do movimento de 1930, de novo estatuto fundamental do Piauí, se deu a 14 de outubro de 1934. Reuniram-se os eleitos a 21 de abril de 1935: José Martins de Castro e Silva, Osias Correia, Gayoso e Almendra, Anfrísio Lobão Veras Filho, Aarão Parentes, Teodoro Sobral, Elói Portela Nunes, Luís Pires Chaves, Francisco Alves Cavalcante, José Narciso da Rocha Filho, Nelson Coelho de Resende, Raimundo Borges da Silva e Enock Cícero e Silva.

Anuladas as eleições de Alto Longá, o deputado José Narciso da Rocha Filho perdeu o mandato, convocando-se o suplente João Emílio Falcão Costa. O Tribunal Superior Eleitoral, porém, manteve José Narciso como constituinte, afastando João Emílio, que, posteriormente, teria nova convocação.

A Assembléia distribuía-se em 17 deputados governistas e 07 oposicionistas, estes últimos representados por Helvécio Coelho Rodrigues, José Auto de Abreu, Jônatas Correia, Gonçalo Nunes, Lino Correia Lima, José Mendes da Rocha Chaves e Cláudio Pacheco.

Elaboraram o projeto de Constituição os desembargadores Adalberto Correia Lima e Simplício Mendes.

Esteve assim constituída a comissão constitucional da Assembléia: Oséias Sampaio, Cláudio Pacheco, Nelson Resende, Francisco Alves Cavalcante e Enock Cícero e Silva.

A presidência da Constituinte coube ao deputado Gayoso e Almendra.

Antes de promulgada a Constituição, a Assembléia elegeu Governador do Estado, por quatro anos, o médico Leônidas de Castro Melo, que assumiu a 3 de maio de 1935. Também indiretamente se elegeram os senadores João Pires Rebelo e Luís Mendes Ribeiro Gonçalves.

A 21 de junho de 1935 suicidou-se o constituinte José Martins de Castro e Silva, filho do município piauiense de Valença.

A nova Carta Constitucional do Piauí foi promulgada a 16 de julho de 1935. Dos convocados para a Constituinte deixaram de assiná-la José Martins de Castro e Silva, Osias Correia, Anfrísio Lobão Veras Filho, Luís Pires Chaves, Lino Correia Lima e José Narciso da Rocha Filho.

Dois que não participaram da primeira convocação assinaram-na: João Emílio Falcão Costa e Heráclito Araripe de Sousa.

Durou pouco a Constituição do Piauí de 1935. Dia 10 de novembro de 1937, houve golpe nas instituições políticas, liderado por Getúlio Vargas. Fecharam-se o Congresso Nacional, as Assembléias Legislativas e as Câmaras de Vereadores. O país teve uma Constituição outorgada. Somente em 1945 retornou-se ao processo eleitoral. Elegeram-se senadores e deputados que fizeram nova Carta Magna federal, a 18 de setembro de 1946.

O Piauí teria nova constituição em 1947, dia 22 de agosto.


A. Tito Filho, 29/10/1988, Jornal O Dia

quinta-feira, 3 de março de 2011

PIAUÍ

Ingressou o Piauí no século XIX de modo precário; tardio povoamento dificuldades de comunicação com o Brasil e o mundo, exclusivo comércio do boi, ausência de agricultura, falta de escolas - fracas perspectivas, pois, na centúria que se inicia.

A primeira metade dos novos cem anos constitui objeto de estudo que expõe, apoiada sobre sérias fontes de conhecimento, a Professora Miridan Britto Knox, bem documentada - uma documentação que ela confere, examina e, de que retira a verdade, para a narrativa segura e análise esclarecedora.

O período que ora se registra e interpreta tem características esmorecedoras: economia de subsistência, riquezas estagnadas, comércio e lavoura em imensas dificuldades, pecuária decadente, tristes condições educacionais. Não se pode ignorar, porém, que o Piauí se envolveu em movimentos revolucionários - dois, sobretudo a Independência e a Balaiada.

No alvorecer do século XIX, o ouro, o diamante e o açúcar declinavam no Brasil. O norte valia dois terços de atividade útil no território nacional. Se o comandante português Fidié mantivesse o Piauí fiel aos lusitanos, como queria D. João VI. Portugal dominaria a nossa fartura em gado e evitaria a vitória dos baianos, na luta pela emancipação política, cortando-lhes o fornecimento de carne. Maranhão, Pará e terras piauienses formariam o Brasil Português, subordinado a Lisboa. Tal não se deu.

Fidié abandonou a sede do governo e seguiu com a tropa para Parnaíba, município em cuja sede se fez manifesto em favor da independência. Ausentes os soldados e respectivas armas, Manuel de Sousa Martins, futuro visconde da Parnaíba, instituiu em Oeiras, então capital administração por ele chefiada. Depois, em março, deu-se a sangrenta Batalha do Jenipapo no Piauí, que selou a unidade brasileira. A definitiva derrota dos exércitos portugueses se verificaria poucos meses depois, em Caxias do Maranhão.

A guerra violenta dos balaios, no Maranhão e no Piauí, tem causas num choque de culturas. As origens próximas da luta estavam na prática perniciosa do recrutamento feito pelo Exército, obrigando-se que pobres caboclos entrassem para o serviço das armas, longe da terra e da família. As origens mais graves, entretanto, eram outras: as condições de ordem econômica geradoras de permanente angústia coletiva; a terra confiada a poucos, aos que representavam o regime político e que viviam de explorar o homem do interior, bem assim a fome e a estrutura social, o brasileiro esquecido e abandonado.

Nestes primeiros cinqüenta anos do século XIX, no Piauí, mais de duas vintenas pertencem ao ciclo do visconde da Parnaíba, a quem coube defender e manter a ordem enquanto teve prestigiado o seu mando e autoridade.

Mestra universitária estudiosa, pesquisadora de aplaudida probidade, Miridan Britto Knox reúne palpitantes e aplaudidos estudos de natureza social e política, fiel aos ensinamentos históricos, e assim contribui de modo louvável para relembrar o passado piauiense, que ela busca em fontes primárias de irrecusável valor.


A. Tito Filho, 27/07/1988, Jornal O Dia

MESTRE HIGINO

Nasceu a 11-1-1858, no sítio Bacuri, município de São José das Cajazeiras, hoje Timon, Maranhão. Pais: Luis José da Cunha e Ludgera Maria da Conceição. Com os irmãos mais velhos estudou primeiras letras. Com 12 anos veio para Teresina, empregando-se no comércio. Estudou escrituração mercantil. Guarda-livros. Rumou aos 20 anos para são Luís, onde estudou preparatórios. Já demonstrava acentuada vocação literária. Bacharel em 1885 pela Faculdade de Direito do Recife, discípulo dos mais inteligentes de Tobias Barreto. Regressou a Teresina. Aderiu à política. Redator de "A Imprensa". Em 1887 juiz municipal de Picos (Maranhão). Proclamada a República, fixou residência na capital do Piauí. Grande lutador. Propagandista dos momentos sociais da abolição e da República. Orador na praça pública, conferencista, estudioso da filosofia, jornalista de pulso, polemista desassombrado, professor e advogado.

Escrevendo sobre Higino Cunha, o acadêmico Moura Rego lembra a sua formação na Faculdade de Direito do Recife, na qual pontificava sobretudo Tobias Barreto, chefe de uma verdadeira revolução espiritual no domínio das idéias. E acentua: "Assim predisposto, e alistado nas fileiras que viriam emancipar a mentalidade nacional, sua ação é decisiva. Passa em revista, maravilhado pela novidade, todo o vasto contingente de idéias que invade então os círculos acadêmicos; atira-se aos largos caminhos abertos na fúria do desbravamento, ansioso de atingir as elevações do último extremo; examina métodos e compara sistemas, aprofunda-se em indagações sobre a vida, sobre a matéria; percorre os domínios da ciência, da religião e da filosofia; faz cultura, armazena conhecimentos; abraça Kant e Haeckel. Encontra, afinal, água nova para sua sede, luz brilhante para sua treva".

Notável jornalista. As suas polêmicas, quase sempre em defesa de princípios, abrangeram quase todos os setores da cultura. Quando estudante escreveu em "Folha do Norte" (Recife). Teve colaboração valiosa na imprensa de Teresina: "A Imprensa", "A República", "Correio de Teresina", "O Habeas-Corpus". Defendia vigorosamente as suas convicções religiosas, políticas e filosóficas. Em Manaus, onde esteve entre 1895 e 1896, trabalhou em "A Federação" e em "O Estado do Amazonas", travando lutas memoráveis.

Sucedendo-o na Academia Piauiense de Letras, sustentou Moura Rego: "Do meio do seu ateísmo intransigente, do meio da sua heresia, surgia sempre, num contraste interessante, o homem bom. Atacava os padres e fazia caridade; atirava nos santos da igreja as pedras da sua irreverência e levantava do pó os necessitados e os desprotegidos da sorte; negava o céu e acreditava no amor; desconhecias as leis de Deus e obedecia aos seus mandamentos. Como juiz, jamais cometera uma injustiça, e como advogado as suas causas eram as dos oprimidos, dos explorados, das vítimas do ódio ou da tirania".

Mestre de várias gerações. Professor acatado e brilhante da Faculdade de Direito do Piauí. Amigo dos moços, os quais recebiam do deslevo incentivo constante.

Na política e na imprensa, foi "um grande explorado", como acentuou Cristino Castelo Branco.

Higino cultivou também a poesia e a história.

Aposentou-se como procurador dos Feitos da Fazenda Estadual (Piauí). Publicou as seguintes obras:

● "Pro Veritato" (crítica literária - 1883);
● "O Idealismo Filosófico e o Ideal Artístico", 1912;
● "O Teatro em Teresina" (conferência - 1923);
● "História das Religiões no Piauí" (1924);
● "Os Revolucionários do Sul" (1936);
● "A Igreja e a Constituição de 1924";
● "Memórias Autobiográficas";
● "Anísio de Abreu - sua vida, sua obra, sua morte";
● "Matias Olímpio de Melo";
● "A Defesa do Professor Leopoldo Cunha".

Higino Cunha fez parte da Junta que governou o Piauí, no período de 21-12-1891 a 11-2-1892, integrada também por João Domingos Ramos, Clodoaldo Freitas, José Eusébio de Carvalho Oliveira, Elias Firmino de Sousa Martins e José Pereira Lopes.

Faleceu em Teresina a 16-11-1943.


A. Tito Filho, 27/03/1988, Jornal O Dia

quarta-feira, 2 de março de 2011

ACADEMIAS

Deixemos de lado outras academias que nasceram e não floresceram na antiguidade dos tempos. Façamos referencia a Academia Francesa, criada pelo cardeal Richelieu, com as suas quarenta poltronas, e que se tornou modelo de quantas se foram fundando com os mesmos objetivos e vaidades. Cheguemos ao Brasil. Aqui, na segunda capital do país, nos últimos tempos do século passado, a fina flor dos literatos residentes no Rio, deliberou estabelecer uma sociedade de defesa da língua e desenvolvimento cultural, denominada Academia Brasileira, depois conhecida como Academia Brasileira de Letras, cuja primeira presidência muito valorizou o grêmio, pois confiada a Machado de Assis. Antes dela os cearenses, sempre espertos, puseram em funcionamento a Academia Cearense de Letras, que desapareceu e anos mais tarde reapareceu.

A Academia Brasileira frutificou em academias estaduais. Cada unidade da Federação foi instituindo a sua, com o aproveitamento da prata da casa. Nelas se congregavam os principais homens e mulheres dedicados à vida literária ou expressões eloqüentes dos diversos ramos do saber humano, na medicina, na engenharia, no direito, no magistério. Esses clubes gozavam do apreço e da consideração do poder público e da coletividade, que delas recebiam cooperação freqüente nos assuntos culturais.

Passavam-se os anos e as entidades acadêmicas mais se prestigiavam e os seus membros se projetavam na admiração e no respeito geral. De uns vinte anos e esta parte, porém, a excessiva vaidade humana iniciou o processo de parir academias, grêmios e sociedades literárias por tudo quanto biboca haja neste Brasil de asnices internas, dívidas externas e besteiras permanentes. Existem academias de letras por todos os lugares, clubes de poesias, agremiações de oratória, ateneus, institutos, com os seus quadros de sócios nos quais figuram os mais variados tipos: analfabetos, alfabetizados, débeis mentais. Da acima do meio da canela a quantidade de sócios, sócios beneméritos, sócios honorários e correspondentes. Outro dia fundaram a Academia Pindurassaiense de Letras ou mais esclarecidamente a Academia de Letras do Arraial de Pindura Saia, nos confins do Mato Grosso do Sul.

Chegaria a época mais triste de quantas arapucas se vão criando: a fase dos negócios rendosos. O ingresso da pretensa sumidade literária custa dinheiro, com dinheiro se cobra pelo diploma respectivo. Já estão distribuindo títulos de sócio benemérito, honorário e correspondente cada um de preço especial. A produção livresca estarrece. Há hoje nessa vastidão brasileira uma subliteratura que rebaixa o país a níveis da imbecilidade. Fabricam-se poesias por toneladas. Abundam poetas, críticas, contistas. O grande Marcuse dizia que três forças dominavam a sociedade: a econômica, a política, a de inteligência. Pois esta última está na moda: ser ESCRITOR dá prestígio, portas abertas, importância. Leio em jornal do sul que um subúrbio de Uberaba em Minas, chamado Pau Fincado, fundou a Academia de Letras dos Marginais. Talvez seja um respeitável centro das atividades do país.


A. Tito Filho, 29/06/1988, Jornal O Dia

terça-feira, 1 de março de 2011

ÁLVARO MENDES

Chamou-se Álvaro de Assis Osório Mendes, nascido na antiga capital piauiense de Oeiras, em 1853. Formou-se na Faculdade de Direito do Recife, aí se educando numa época em que a ânsia da investigação dominava os espíritos. Exerceu a promotoria pública de três comunidades maranhenses. Ocupou o juizado de direito de São João, Amarante e União, no Piauí. Criado o Tribunal de Justiça, escolhe-o o governador Gabriel Luís Ferreira como um dos desembargadores do colegiado, junto com Polidoro Burlamaqui, Augusto Collin, Helvídio Aguiar e João Gabriel Baptista. Renunciou ao elevado cargo por motivo de foro intimo, pois a maioria dos colegas votou contra ele uma suspeição que lhe pareceu desairosa à integridade de magistrado. Abraçou à seguir a carreira política. Três vezes chefe de polícia do Piauí. Candidato ao Senado da República, não teve a eleição reconhecida no Rio de Janeiro. Aceitou, na época, uma promotoria pública, no Estado do Rio. Depois, tesoureiro da Imprensa Nacional. Eleito senador em 1899, teve a eleição homologada pelo Congresso em 1900. Governador exerceu o mandato no Período de 01-07-1904 a 05-12-1907, data do seu falecimento em Teresina. Na sua administração, construiram-se algumas obras públicas. Inaugurou-se o serviço de abastecimento d'água da capital piauiense, até então servida pelos prestimosos CARGUEIROS, como eram chamados, de latas equilibradas sobre a rodilha na cabeça, ou tocando jegues de ancoretas nos lombos, de casa em casa, para venda do indispensável líquido.

Fatos sociais de grande repercussão ocorreram no tempo de Álvaro Mendes, como a visita do presidente eleito da República, Afonso Pena a Teresina. No terreno religioso, assumiu o primeiro bispo do Piauí, Dom Joaquim Antônio de Almeida, em 1906. Era potiguar de nascimento. Criou o nosso bispado, em 1901, o papa Leão XIII, pela bula Supremum Catholicum Ecclesiam.

Ainda na administração Álvaro Mendes houve fato auspicioso: instalou-se empresa telefônica particular, aparelhos de manivela, pertencente à Joca Broxado.

Álvaro Mendes sempre colocou os interesses da consciência reta acima de quaisquer outros. Enérgico e calmo. O seu governo foi de reconstrução moral. Respeitável julgador, culto e dado a prática da mais elevada justiça.

Discursando, na Academia Piauiense de Letras sobre sua forte personalidade, acentuou Matias Olímpio: "O direito para ele foi uma arma educativa. Levou sua longa judicatura a incutir o senso jurídico na alma do sertanejo, procurando abrir clareiras no seu cérebro e elevar o seu moral. Nesse afã consumiu anos".

Higino Cunha acentuou sobre ele: "Quem não o conhecesse de perto dificilmente poderia saber que aquele vulto franzino e modesto encerrava um jornalista de raça, um político às direitas, um magistrado exemplar e um amigo adorável".

Como juiz, desembargador, senador e governador, Álvaro Mendes passou longos anos amigado com mulher de rara grandeza espiritual. A mulher ao menos podia freqüentar o palácio governamental. Jamais se preocupou com os preconceitos da época. Casou-se perto de morrer. Os cometimentos dos amores do ilustrado homem público se encontram narrados por William Palha Dias, no livro "Mulher Dama, Sinhá Madama".

O nome de Álvaro Mendes está numa das principais vias públicas de Teresina, centro da cidade.


A. Tito Filho, 26/03/1988, Jornal O Dia